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terça-feira, 28 de maio de 2013

TECNOLOGIA - PRA QUÊ MESMO?





 Os três estágios da técnica, segundo Ortega y Gasset:
 1. a técnica do acaso; 2. o artesanato; 3. a técnica do técnico.


 1 A técnica do acaso não consegue senão um escasso repertório de atos, sempre iguais, produzindo as mesmas coisas, e que mal se distinguem da atividade natural biológica. Falta ao seu beneficiário, o chamado primitivo ou selvagem, consciência específica de seu precário instrumental, um prolongamento da manejabilidade da mão, de que, um dia, Engels fez exaltado elogio. Se ele inventa, não sabe que inventa.

2 Já no segundo estágio, o repertório aumenta, acompanhado pela consciência de que o seu uso, parte de uma tradição estabilizada, demanda a capacidade especial de alguns homens: os artesãos, artífices e profissionais, conservadores por excelência; o que fabricam ou modificam resulta de uma aprendizagem herdada, esquecida, que continua inercialmente, como repetição de práticas passadas, fixando-se num sistema de artes e ofícios. Mas o artesão é, ao mesmo tempo, técnico e operário, o que sabe e o que executa.

3 A técnica do técnico é aquela do pleno conhecimento das práticas em uso, quando o homem chega a fabricar o instrumento que pode fabricar tudo: a máquina. Então o conhecimento pleno das práticas e, portanto, da técnica, corresponde à noção de uma só capacidade ilimitada de fazer e de produzir. Ortega aqui, já tem aqui em vista a técnica avançada, a tecnologia, que separa o técnico do operário, e cujas potencialidades incalculáveis assustam. Devido a essa capacidade para fazer e ser tudo, capacidade imaginável, o homem já não sabe que é o que efetivamente é. E, no entanto, a assustadora técnica, a tecnologia, como pletora de possibilidades, é mera forma oca – como a lógica mais formalista, é incapaz de determinar o conteúdo da vida.

Fonte:
História e ontologia (Da essência da técnica)
Benedito Nunes
Universidade Federal do Pará
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1517-24301999000100002&script=sci_arttext

sexta-feira, 24 de maio de 2013

RECORDAR É VIVER (breve defesa da evocação)


















Adão, se existiu, só houve um. Ninguém mais pode ser o primeiro homem. Ser adâmico é não ter pretérito. Só presente e futuro. Essa é uma impossibilidade humana. Só Adão não tem passado.   Mito do ser-inaugural, antes dele nada havia a recordar. Pra nós, pobre humanos, a recordação é necessária e vital. Recordar é viver, literalmente.  Digo isso àqueles que teimam em negar o passado, como se sua sombra frondosa não estivesse sobre tudo e todos. Há coisas irremediavelmente feitas desse tecido, que, por mais que queiram alguns, sustém toda a tessitura do presente. Coisas fundantes e vitais, tais como a língua que falamos, as ciências, as artes. Quem há de supor uma língua toda ela feita de elementos do presente? Ou uma ciência que tente se erigir de um zero dos saberes? Há possibilidade da recriação da roda, do plano inclinado, do ponto e da reta?
Por isso, se todos somos feitos de passado, mesmo os que o negam, não há pecado algum em evocar, como não há mal nenhum no futurista. A evocação é a irmã que abre a porta ao vaticínio. E não é por acaso que o poeta já dizia:

“... que as crianças cantem livres sobre os muros
e ensinem sonho ao que não soube amar sem dor
e que o passado abra os presentes pro futuro,
que não dormiu e preparou o amanhecer...” (Taiguara)


Carlos Pequeno do Espírito Santo
filodóxo e beletrista do Largo do Amparo - Olinda