Que falta nos faz Romero Amorim... |
A propósito da feliz iniciativa, neste mês de abril, da chamada para eleger os representantes do Comitê para a Salvaguarda do Frevo, temos duas palavrinhas a dizer:
1) A cultura popular, os folguedos, brincantes e outras festas de rua, sejam religiosas ou profanas, é fruta da atividade espontânea do povo anônimo. Tanto faz se devotos ou foliões. Cultura se faz na rua. Por isso, de nada adianta o Poder Público intentar um folclore por meio de eventos criados por lei, artificialmente.
Essa maneira de atuar do Estado nasce de uma compreensão defeituosa da cultura e da tradição, elementos essencialmente intra-históricos, como dizia Unamuno. O erro consiste de uma tentativa inútil de desentranhá-las do seu nascedouro. A cultura popular é, pois, construção intra-histórica, ou seja, é do povo o seu cerne e a sua alma. Consegue assim, o Estado, ao legislar sobre costumes e folguedos, tão-somente transformá-los em meros espetáculos para fruição de turistas. Meros produtos...
Não vi de perto, mas ouvi dizer, pela boca de viajantes, que, no Norte do Brasil, há índios à beira das rodovias, colares e pulseiras às mãos, acenando aos caminhoneiros. Induzidos pela compreensão mercantilista do turismo, parecem, eles mesmos, os silvícolas, exóticas criaturas artesanais, expostas no acostamento. Pobres nativos, são desalojados da vida tribal e fecunda do aconchego da sua intra-história, para serem lançados nesse triste espetáculo, que se rende ao apelo da mídia, do capital, e o que é pior, da necessidade.
NÃO É ISSO O QUE QUEREMOS PARA A CULTURA POPULAR DE NOSSO ESTADO! SOMOS UMA CULTURA COM RAÍZES AUTÊNTICAS E VIGOROSAS E POR ISSO, ATENÇÃO COM O QUE SE ESTÁ FAZENDO, AO TRANSFORMÁ-LA EM MERO PRODUTO!
Não vi de perto, mas ouvi dizer, pela boca de viajantes, que, no Norte do Brasil, há índios à beira das rodovias, colares e pulseiras às mãos, acenando aos caminhoneiros. Induzidos pela compreensão mercantilista do turismo, parecem, eles mesmos, os silvícolas, exóticas criaturas artesanais, expostas no acostamento. Pobres nativos, são desalojados da vida tribal e fecunda do aconchego da sua intra-história, para serem lançados nesse triste espetáculo, que se rende ao apelo da mídia, do capital, e o que é pior, da necessidade.
NÃO É ISSO O QUE QUEREMOS PARA A CULTURA POPULAR DE NOSSO ESTADO! SOMOS UMA CULTURA COM RAÍZES AUTÊNTICAS E VIGOROSAS E POR ISSO, ATENÇÃO COM O QUE SE ESTÁ FAZENDO, AO TRANSFORMÁ-LA EM MERO PRODUTO!
2) Bochichos do meio cultural revelam a possibilidade de que as agremiações mais humildes, que não têm inscrição estadual ou municipal, sei lá, CNPJ, estariam alijadas desse projeto de salvaguarda. Bem, mas se o projeto foi pensado para proteger o frevo e suas derivações, a quem deveria, prioritariamente, amparar? Aos grandes blocos, que têm o seu valor, mas que não precisam de ajuda do poder público, pois são formados pela nata da sociedade, por foliões de melhor poder aquisitivo?
No caso que me toca mais de perto, os blocos líricos menores e sem mídia, recomendo cautela! Não devemos ceder ao anseio de crescer por crescer, e, assim, nos descaracterizarmos. Pois, pode parecer redundante o que lhes digo agora, mas, cultura popular se faz mesmo é pelo povo e para o povo. O mais não passa de uma artificial, estéril e inútil intervenção do Estado na espontaneidade dos anônimos geradores da tradição e dos costumes. E é isso o que mais me preocupa: a espontaneidade. Os blocos líricos têm sua origem ligada às famílias suburbanas, com seus saraus e serestas, com seus ranchos de reis e pastoris, vide Prof. Julio Vila Nova, e nasceram por iniciativa desses foliões, e não do poder público. Essa sempre vai ser a forma como nascerão as agremiações e os brincantes: do seio do povo, das famílias e de seus grupos mais próximos. E pode parecer uma contradição o que agora vou lhes dizer, mas, mesmo que sejam segregados, que não consigam os requisitos formais para receber as verbas públicas, os cordões líricos surgirão de todos os lados. Pequenos, modestos, sem o brilho das plumas e dos paetês, mas cheios de criatividade e de alegria!
Se esses bochichos realmente forem verdadeiros, nada há a temer, pastorinhas e flabelistas! A espontaneidade de nossa gente irá resistir, como sempre vem resistindo, e nossos blocos sem mídia estarão, ainda assim, na vanguarda da alegria do carnaval popular do Recife! Com verbas ou sem elas, seremos sempre os "alegres bandos"!
Deixo para reflexão, trecho de um samba afamado, do Chico Buarque:
Amanhã há de ser
Outro dia
Você vai ter que ver
A manhã renascer
E esbanjar poesia
Como vai se explicar
Vendo o céu clarear
De repente, impunemente
Como vai abafar
Nosso coro a cantar
Na sua frente..."
P. S.:
Quanto à imagem deste post, em que o poeta Romero Amorim, recebe flores na Praça da Várzea,
lamentamos a ausência de nosso patrono. Ele ia até o lugar em que nascem os pequenos blocos. Ele nos levava sempre uma palavra de motivação. Saudades do Poeta da Aurora...
3 comentários:
Participo das reuniões do Comitê da Salvaguarda do Frevo que está produzindo o regulamento do Comitê e, também, o regulamento da eleição dos novos membros que serão escolhidos em votação no II ENCONTRO DA SALVAGUARDA DO FREVO.
A SALVAGUARDA DO FREVO é uma continuidade do projeto da Pesquisadora Carmem Lélis, que visa o principal objetivo do projeto: COLETAR E CATALOGAR TODAS E QUAISQUER PRODUÇÕES REFERENTES AO FREVO.
O impasse gerado pela inclusão da obrigatoriedade do CNPJ, não é o Comitê que está exigindo. É o Tribunal de Contas do Estado e a Prefeitura da Cidade do Recife, visto que, as agremiações que não estão regularizadas comercialmente, são EXPLORADAS por produtoras atravessadoras. Independente disso, as metas do projeto da SALVAGUARDA DO FREVO serão cumpridas sem excluir nenhuma agremiação carnavalesca, ligadas ao frevo. Sejam Clubes, Troças ou Blocos de pau e cordas, independente de suas situações financeiras.
A bronca do CNPJ é lá com o Tribunal de Contas do Estado e com a Prefeitura. Não é do Comitê da SALVAGUARDA DO FREVO.
Hamilton Florentino
Participo das reuniões do Comitê da Salvaguarda do Frevo que está produzindo o regulamento do Comitê e, também, o regulamento da eleição dos novos membros que serão escolhidos em votação no II ENCONTRO DA SALVAGUARDA DO FREVO.
A SALVAGUARDA DO FREVO é uma continuidade do projeto da Pesquisadora Carmem Lélis, que visa o principal objetivo do projeto: COLETAR E CATALOGAR TODAS E QUAISQUER PRODUÇÕES REFERENTES AO FREVO.
O impasse gerado pela inclusão da obrigatoriedade do CNPJ, não é o Comitê que está exigindo. É o Tribunal de Contas do Estado e a Prefeitura da Cidade do Recife, visto que, as agremiações que não estão regularizadas comercialmente, são EXPLORADAS por produtoras atravessadoras. Independente disso, as metas do projeto da SALVAGUARDA DO FREVO serão cumpridas sem excluir nenhuma agremiação carnavalesca, ligadas ao frevo. Sejam Clubes, Troças ou Blocos de pau e cordas, independente de suas situações financeiras.
A bronca do CNPJ é lá com o Tribunal de Contas do Estado e com a Prefeitura. Não é do Comitê da SALVAGUARDA DO FREVO.
Hamilton Florentino
Hamilton Florentino, meu maestro, sempre atento ao que acontece na nossa cena cultural.
Vindo de você, eu acato toda argumentação. Bem, mas já vem acontecendo a segregação e isso sentimos na pele, no dia a dia. Que a exigência de CNPJ seja para fins de recebimento das verbas, tudo bem. Mas para evitar que se vote? O voto é direito de todos os foliões.
De todos os que se interessam pelas coisas de nossa cultura. E cultura não se faz com "panelas", cultura é algo que não se pode conter. Está nas ruas. Pois bem, já estou pensando em criar uma troça anárquica "CNPJ é a mãe!"... É assim que se resiste aos ditames de meia dúzia. Os blocos sem CNPJ vão continuar a existir e a pagar as suas contas e os seus impostos...
Mas, vc é o meu representante no comitê. Vc já faz salvaguarda do frevo no seu cotidiano.
E, olhe, que eu sou seu fã!!!
Abç fraterno.
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