Orquestra de Batutas de São José |
Créditos da imagem:
Estava eu no encontro de blocos Eu Quero é Mais, naquele fatídico 16/02/2013,
dia em que o nosso músico Luquinhas Lyra foi baleado covardemente, na frente do Estádio do Náutico, (hoje, faz 30 dias, ele já saiu do
coma e está em franca recuperação)...
Bem... mas o que quero mesmo registrar é algo muito
constrangedor que, infelizmente, meus pobres ouvidos foram obrigados a ouvir, no
trajeto dos blocos líricos. Estávamos na Prudente de Morais, uma das famosas ladeiras
de Olinda, quando cruzamos com o afamado Bloco Batutas de São José, do
inolvidável Maestro João Santiago, que, no início do século XX, compôs Sabe lá o que é isso, a mais gostosa
marcha de blocos do nosso carnaval:
“...sem você, meu amor,
Não há carnaval...
Vamos cair no passo
E a vida gozar!”
Pois bem, eu, folião de carteirinha e fã do Batutas, fiz a tradicional
saudação:
Não deixem morrer
Batutas!
E, logo em seguida, escuto uma bela e firme voz feminina
gritar, bem atrás de mim:
Já morreu faz tempo!
Voltei os olhos, curioso, e vi uma bela pierrete, portando um
belíssimo flabelo, à frente de um bando de outras pierretes, lindamente
trajadas. Era flabelista, a moça de cuja boca de carmim eu ouvi aquela verdadeira
blasfêmia contra o bloco Batutas de São José, deca-campeão dos
carnavais na década de 1960.
Ah, a década de 60...
Batutas, por essa época, dominava o carnaval,
seguido pelos Banhistas do Pina, outro grande campeão e por outras belíssimas agremiações, que eram a alegria dos amantes dos blocos líricos, como eu.
Não,senhorita! Não morreu, o grande Batutas. Jamais morrerá!
Ele está
na nossa alma, no sangue dos pernambucanos e foliões de todas as partes.
E é
por isso que lutamos, nós compositores dos blocos anônimos, os que têm pouca
mídia e, portanto, pouca ajuda da Prefeitura. Lutamos pela preservação dos
blocos mais humildes, que já foram a fina flor desse carnaval lírico.
Dia
desses, vi Pirilampos de Tejipió, que evoluía, humildemente, no Pólo da Várzea.
Meu coração ficou apertado ao ver o sofrível aspecto daquele bloco afamado, que foi o xodó do
grande Guilherme de Araújo, e que sempre fez bonito nos carnavais de outrora. Não
é à toa que nos versos de um dos mais belos frevos de bloco de todos os tempos, cita-se Guilherme e o seu Pirilampos:
“Felinto, Pedro Salgado, Guilherme, Fenelon,
Cadê teus blocos famosos?
Bloco das Flores, Andaluzas, Pirilampos, Apois Fum
Dos carnavais saudosos?”
Pois é, moça, é por eles que lutamos bravamente, que resistimos contra os insensíveis gestores da coisa pública, com honrosas exceções, que nada sabem dos bastidores de luta, dos sacrifícios que se fazem para botar um bloco na rua. E aqui louvamos a resistência dessa nova geração, que gosta do lirismo desses blocos antigos. Por isso, repito:
Não,senhorita! Não morreu, o grande Batutas. Jamais morrerá!
Para concluir, tenho uma auspiciosa notícia:
Descobri, em andanças
pelo meu querido bairro da Várzea, que os blocos sem mídia estão articulando
encontros na periferia da cidade, verdadeiras jornadas carnavalescas, em que seus cordões de pastorinhas, suas
orquestras dedilhadas em cordas e palhetas, seus seresteiros e poetas estarão empunhando o flabelo da resistência popular pela nossa cultura. Exultemos! Um grupo solidário de foliões está conspirando em prol da alegria!
Ainda
ontem, à sombra de um frondoso jambeiro varzeano, centenário como tudo naquele arrabalde,
ouvi palavras alvissareiras de uma das flores do Capibaribe, (que, por hora, não
direi o nome, mas quem é de bloco lírico, sabe bem de quem falo). Trouxe-me, aquela flor, palavras inteligentes e
decididas, que alegraram e muito o meu coração carnavalesco. É que nós, os blocos
enraizados nos subúrbios do Recife e cidades do entorno, a partir de junho,
talvez antes, estaremos trocando visitas uns aos outros, em festivas caminhadas
líricas, pelas ruas dos nossos bairros, subvertendo, com alegria, o descaso dos
nossos gestores, e produzindo cultura pelos nossos próprios meios, mesmo sem
mídia, sem subvenção, que isso nunca foi obstáculo para os verdadeiros foliões.
Avante, seresteiros, avante, pastorinhas! O verdadeiro
carnaval lírico está de volta aos lugares de onde saiu: os subúrbios históricos
do Recife.
Salve a periferia, salve os
blocos líricos, salve o movimento de cultura popular, que nunca morreu, nem
nunca morrerá.
Batutas tem um passado de lutas.
Salve Batutas, Batutas vai
vencer!
Luiz Eurico de Melo Neto
(um registro para a história)
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